sábado, 10 de novembro de 2012

O crime de Vicent Nicholls - Capítulo XVII


Eu não amo Vicent. Amo você.”
Foram as seis palavras mais dolorosas que li na vida. Eu não conseguia acreditar que Dora, minha Dorota, poderia ser capaz de dizer algo dessa maneira. Tirei os olhos do papel e encarei o rosto sem vida de Phillip, logo à minha frente. E desejei que fosse eu ali, estirado no chão em seu lugar. E então, como que em um roteiro de teatro, no exato momento em que esse pensamento me ocorreu, ouvi um clique leve logo atrás de mim. Era o barulho de alguém engatilhando uma arma.
A morte. Seria ela uma senhora encapuzada, carregando uma foice? Seria ela um anjo, com feições bondosas? Eu esperei que ela chegasse, para abrandar a dor que me dilacerava por dentro. Mas não veio; e eu achei que meu carrasco estaria esperando para mostrar-me sua face.
Levantei as mãos à altura da cabeça, depois fiquei de pé vagarosamente. Tentei respirar fundo, mas era difícil engolir o choro. Então eu me virei. E não pude acreditar em meus olhos. Cheguei a cogitar a hipótese de estar delirando  e queria que estivesse  mas a suposição de uma alucinação caiu por terra quando ela falou.
 Você estragou tudo, Vicent  o tom de Dorota era acusador.
 V-você...
 Sabe, querido, eu cheguei a acreditar que você não seria capaz de matá-lo  ela comentou de uma maneira descontraída, como se falasse qualquer coisa relacionada ao que eu estava vestindo  Sempre foi um covarde! Mas eu soube manipulá-lo bem...
As palavras sumiram de mim. Tantas indagações quiseram sair de uma só vez que acabaram congestionando a passagem; e entalaram-se todas na garganta. E eu meramente fui capaz de encarar o rosto sereno de Dora, com a boca semiaberta e os olhos esbugalhados de surpresa.
 É uma pena que ele tenha morrido, pobre coitado  ela apontou com a arma para o corpo de Phillip, depois voltou a mirar em mim  Mas o que poderia eu fazer?  Dorota deu de ombros  Antes ele do que eu.
 Do qu... do que v-você está falando?  gaguejei.
Dora soltou uma risada que ecoou pela sala de um jeito extremamente diabólico.
 Francamente, Vicent. Será que podes ser mesmo tão cego?  ela fez uma pausa, com uma das sobrancelhas levantadas  Você se vingou da pessoa errada. Eu matei Marcus Mason.
Meus joelhos cederam e eu caí sobre o chão lustroso, ajoelhado diante da mulher que me enganou durante todos esses anos. Então eu percebi que tinha matado meu próprio irmão. E que acreditei nas palavras doces de Dorota; no jeito inocente da máscara que ela usava, quando na verdade era uma assassina. Phillip morreu. Foi morto por um crime que jamais chegou a cometer.
E meu pai foi assassinado pela mulher que eu amava.
Ela continuou a falar:
 Naquela noite, quando fomos dormir, eu não fazia ideia de que estava prestes a cometer um crime. Na verdade, acho que muitas coisas não saíram bem como o planejado  o olhar de Dora ficou distante por alguns instantes, como se pudesse visualizar o que estava contando  Eu me levantei no meio da noite e para ir à cozinha buscar um copo d’água. Mas no caminho, ouvi sussurros. Imediatamente reconheci a voz de Phillip, que tratava com um homem alto, que ocultava o rosto sobre a sombra do chapéu. Eles falavam sobre o assassinato de um homem, que era você. Ora, Vicent, mas se você morresse... se você fosse assassinado, eu jamais colocaria as mãos na fortuna dos Mason! Eu sempre soube! Sempre soube que eras filho de Marcus! Só alguém muito imbecil não o perceberia! Não, você não poderia morrer. Então decidi tudo muito depressa: eu mataria Phillip. Eu o mataria para que você pudesse sobreviver; e, como único herdeiro, seria dono de tudo o que Marcus o deixasse como herança.
 Eu não... entendo  sibilei  Quem morreu naquela noite foi...
– É, mais uma vez, as coisas não correram como planejei – interrompeu-me  Quando eu corri até a cozinha e agarrei uma enorme faca para matar Phillip, não reparei que o velho Marcus Mason descia as escadarias, tamanha minha adrenalina. Sofria de insônia, aquele velho porco. Voltei para a sala de estar, pronta para esfaquear seu irmãozinho quando ele voltasse para dentro da casa. Mas ao chegar lá, fui pega por Marcus! Imediatamente, ele percebeu o que eu estava a fazer. Dei três passos para trás e ele veio para cima de mim, com os olhos faiscando de ódio e paternalismo. Que escolhas eu tinha? Era ele ou eu.
 Sua desgraçada!  gritei, ficando de pé  Você matou o meu pai! Você o matou e me fez acreditar que meu irmão o fizera! Sua vadia, eu o matei! Eu o matei e ele era inocente!
 Inocente?  Dorota riu ruidosamente  Você ouviu o que eu acabe de dizer? Ele pretendia matar você, seu imbecil! Eu salvei a sua vida!
 Cale essa boca imunda, sua...
 Olha como trata uma mulher armada, Vicent Nicholls! Seu inútil, nem mesmo para herdar o sobrenome do pai você serviu!  debochou, depois fez questão de acrescentar:  És um bastardo, Vicent!
Antes que pudesse pensar em qualquer coisa, eu agarrei-lhe a mão com a arma da mesma maneira que tinha feito com Christopher no dia em que o conheci. Mas era mais fácil controlar uma mulher, que um rapaz. Ela atirou para cima, mas os dois tiros meramente fizeram buracos no teto. De uma maneira muito habilidosa, ela se desvencilhou de mim e conseguiu se soltar. Numa lufada de adrenalina, corri escada acima, quando um novo tiro atingiu a parede logo atrás de mim. Ofegante, ouvi quando ela gritou:
 Você pode tentar, querido. Mas não vai conseguir escapar de mim!
Então era assim que as coisas terminariam. Eu seria morto por minha própria esposa. Mas naquele momento eu não sabia que ainda havia muitos imprevistos esperando para acontecerem. Uns bons; outros nem tanto.

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2 comentários:

  1. Sempre desconfiei da Dorota... rs
    Este foi, com certeza, o melhor capítulo até agora.
    Aguardo os próximos ansiosamente.

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    1. Lê, depois de ler tantos Sidney Sheldon e tantos Ken Follett, você já é "expert" em descobrir quem, na verdade, é o malvado da história!
      Fico feliz que tenha gostado, logo mais sai o próximo capítulo... só estou buscando um pouco de inspiração!
      Abraço!

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