domingo, 6 de dezembro de 2015

Despedida

Caros,

O Infinita Calmaria foi uma ótima fase da minha vida, tanto por ter me dado a oportunidade de mostrar ao mundo a minha fascinação pelas palavras, quanto pelo mundo (no caso, os meus leitores) ter sido tão gentil em acolhê-las com tamanha atenção e carinho. Confesso que já há muitos meses desde a última vez que entrei aqui no blog. E ao fazê-lo hoje, me deparei com uma enorme quantidade de comentários em diversos textos  muitos dos quais eu já nem me lembrava de ter escrito! –, e me dei o direito de gastar um certo tempo relendo todos os comentários e boa parte dos textos, me permitindo sentir uma nostalgia saudosa de tudo o que eles representam para mim. Fico tão feliz quando alguém diz que um texto meu foi útil para um trabalho da escola, ou que arrancou um sorriso num dia triste, ou que trouxe esperança em algum desses momentos difíceis que a vida às vezes nos obriga a atravessar. Isso, com certeza, é o que mais me dá saudade de quando fazia publicações com frequência.
No início deste ano de 2015, precisei trocar o meu endereço de email. Como todas as minhas coisas (inclusive o Infinita Calmaria) estavam vinculadas ao email antigo, precisei alterar tudo para o novo. O problema foi que essa transição fez com que o blog ficasse assim, desconfigurado. Tentei de todas as formas recuperá-lo, mas não foi possível. É claro que fiquei muito chateada, e por algumas semanas tentei me convencer de que quando sobrasse um tempo eu iria recolocar todas as imagens nos seus devidos lugares, reconfigurar todas as fontes e deixá-lo exatamente como era antes. Doce ilusão! É claro que os meses se passaram, muita coisa aconteceu, e eu acabei me esquecendo disso também. E, por fim, acabei notando que não seria mesmo possível trazê-lo de volta ao normal... 
Muitas pessoas me perguntam porque deixei de publicar no blog, e a minha resposta é sempre a mesma: falta de tempo. Ainda que outros fatores contribuam, este é o maior deles. Quando comecei com o blog, tinha uma rotina muito diferente (e muito menos corrida!) da que levo hoje. Esta semana, no trabalho, alguns colegas descobriram o blog e leram minhas postagens antigas... Ver o entusiasmo deles me fez refletir e lembrar que o motor da minha inspiração para escrever sempre foi esse sentimento de satisfação por deixar o dia de alguém mais colorido.
Não tenho intensão de voltar a publicar aqui. Acho que foi um aprendizado muito grande, sim, e que me trouxe uma enorme satisfação. E é por isso que   talvez um pouco atrasada, mais de um ano depois da última publicação  –, decidi escrever este texto de despedida: despedida do blog, despedida dos textos, despedida dos leitores. Não vou tirar o  Infinita do ar, pois seria uma enorme falta de respeito com todas as pessoas (inclusive eu mesma) para quem ele significa algo de bom. Agradeço a todos vocês, leitores, por terem contribuído tão grandemente com o Infinita Calmaria e com a minha "carreira" de escritora que, assim espero, esteja apenas começando... Vou guardar vocês e o blog na memória e no coração!

Abraço forte e o meu sincero muito obrigada a todos,

Larissa

quinta-feira, 24 de julho de 2014

Porre

Tomou um banho quente pra tirar a noite da memória. Despiu-se das roupas que cheiravam a álcool, nicotina e derrota. Estava consciente, porém, que este último cheiro não iria embora com a água. Desapareceria, quem sabe, com um novo porre.
Ali mesmo, no banheiro, chorou novamente até que a cabeça doesse. Depois foi pego por mais uma crise daquela tosse arrastada, que há dois dias aparecia de repente. Uma dessas tosses insistentes que não vão embora nem com xarope, nem com pílulas, nem com xingamentos (em doses bem mais fartas que os dois primeiros). Aproveitou a irritação para exteriorizar a raiva, tossindo como se, ao fazê-lo, pudesse obrigar o universo inteiro a notar a sua tristeza e irritação.
Concluiu, depois de tudo, que seu porre não era de álcool. Estava com ressaca de si mesmo. Tornou-se, ele mesmo, um monstro: depois de tanto tentar combatê-los.


terça-feira, 15 de julho de 2014

Link para uma série de fotos que vale a pena
O passado não foi feito para ser refeito: sempre suspeito de quem tenta ser perfeito, porque o defeito é só um sujeito que bate no peito e se diz satisfeito com o mau que causou. 
Quanto à nós (que tentamos fazer direito, mesmo faltando de um pouco de jeito), quando nos refazemos bem-feitos, tiramos proveito do que era defeito e todo malfeito se desfaz.

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Verniz

Se eu fosse você, eu te mudaria. Só para me gabar de reinventar alguém, visto que a mim mesma não consigo dar ordens de mudança. Mas se eu fosse você, eu também te estragaria. Porque tem coisas que você faz e tem coisas que você diz que estão paradas em mim de um jeito que qualquer alteração seria uma enorme descortesia com memórias tão bonitas.
Atrevemo-nos a nos despir da fina camada de verniz que mascarava nossos defeitos e fraquezas. Pareceu o fim. Mas então não deu mais para negar que o meu lugar é sob o peso do seu abraço-apertado-de-doer-as-costas. E que o seu lugar é no meu colo-de-ganhar-cafuné. Então nós aprendemos que o fim é tão somente um novo começo; e nos entregamos novamente um ao outro. Como quem se entrega pela última vez. Como quem se cansou de devoluções.



***

Nota:
Meus queridos, nem acredito que estou de volta. Mesmo já há quase um ano sem postagens novas e certa de que o Infinita Calmaria se tornara apenas uma boa lembrança, me vi revigorada pelas palavras de um leitor que chegaram ao meu e-mail na semana passada (acho que estava precisando de palavras como aquelas para ter de volta algum tipo de motivação para escrever). Estou preparando textos novos e pretendo trazer postagens semanais. Obrigada a todos que mesmo depois de tanto tempo vieram me ler novamente! 

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

O pesar dos pesares

E eu vi tanta dor nas suas lágrimas, que dentro de mim foi um deletério só. Me conta como posso tirar de ti tudo o que é sofrimento, e eu o farei. Mas não me deixa descobrir sozinha, porque esse teu silêncio tagarela tanta coisa que eu já nem sei o que ouvir. O que me resta é juntar o meu amor ao teu, e permitir me desfazer também.
Não tenho medo de roubar a tua dor. Caso não dê tempo de saquear tudo, ao menos furto um pouquinho. Enquanto você estiver distraído com a minha tentativa de te fazer sorrir, passo de fininho e você nem vê. Porque o teu sorriso é mais lindo que todas as coisas lindas que eu conheço: e é ele que eu busco. Talvez por isso o meu amor caiba em você.
Minha alma pede a tua. E quando eu fecho os olhos, condeno o momento a uma oração silenciosa ao nosso amor. Só que tudo parece tão triste quando os teus olhos cessam de sorrir, que acomete-se a mim uma enorme vontade de parar o tempo só pra não deixar chegar a hora em que você é um menino no meu abraço. Eu vou dizer um pouco de coisas sobre um monte de coisas; e vou hesitar umas três vezes antes de te encarar de frente, só pelo meu medo de te ver com medo. Mas apesar do jeito acanhado e desastrado – ainda que me falte tudo, ainda que me sobre pouco – jamais vou te negar cuidado. Porque eu nasci pra renascer em você.


segunda-feira, 13 de maio de 2013

Entrelaçada



Entrelacei a minha vida na tua feito nossas mãos quando se encontram. E tudo o que eu pensei em dizer se perdeu no canto esquerdo da tua boca. Enquanto a mansidão desse meio sorriso canhoto e sereno me contagiava, permiti que meu amor tocasse no teu. Eu bem sei o que os teus olhos vão estar me dizendo caso eu os encare; também sei o que estás planejando quando sorri assim. Inibida pela proximidade de lábios tão nobres, porém, entretenho-me numa tentativa tola de parecer um pouco menos desajeitada.
A vontade que tenho é de morar no teu abraço. E quando a saudade acorda, já não posso dormir. À medida que parte de mim protesta contra tua ausência; o que resta é outro emaranhado de quereres. O fato é que me vi absurdamente entrelaçada por esse teu jeito metade homem, dois quartos menino. 

(Parabéns para nós, querido!)

terça-feira, 30 de abril de 2013

Suavidade


Ando tão à flor da pele, que um simples toque faz-me estremecer o corpo inteiro. Não me detenho. É um delírio bem vindo, que me sobe pela espinha e dissipa-se num arrepio ofegante. Sinto-me afogada numa enorme onda de prazeres, engolindo as palavras que não tive tempo para dizer. E concluo intimamente que toda dúvida é uma vontade camuflada.
Dentro de mim fiz um mundo, e eu não sou capaz calá-lo. Várias vozes ecoam dentro da minha cabeça. Sabem que estou aqui a ouvi-las, pois subitamente adquirem tons mais sussurrantes. São as vozes da minha centena de pensamentos, denunciando meu desejo desnudo e a vontade que não sou capaz de esconder. E tudo o que eu sei é que quero transbordar. Pois só assim poderei espalhar-me pelos quatro cantos do mundo, e talvez encontrar um lugar que me caiba. 

quinta-feira, 18 de abril de 2013


Existem mais de cento e cinquenta países no mundo que eu ainda não visitei. Mais de sete bilhões de pessoas que eu jamais conheci. Centenas de idiomas que eu não aprendi; de dias que eu não vivi; de sentimentos que eu não senti;  de livros que eu não li; de músicas e de histórias que eu não ouvi...
E, ainda assim, insisto em ficar parada em uma espantosa inércia, contemplando a insignificância de tomar decisões a respeito do meu futuro, enquanto ainda não sei nem sequer quem eu sou.
Mesmo se eu jamais encontrar, será que a caminhada ao menos se mostrará suficiente para que eu descubra o que tenho procurado durante todo esse tempo?

sábado, 30 de março de 2013

Inception of the Clouds


Enquanto eu explicava as centenas de argumentos que explicitavam o fato do meu chefe ser o pior tipo de palerma existente no universo, você bebia seu uísque fingindo que dava a mínima para os meus problemas, resistindo à tentação de olhar para o relógio mais uma vez. Enquanto enxugava copos do outro lado do balcão, o barman nos encarava com certa impaciência, pois éramos um dos três últimos grupos de clientes que restavam: empecilhos declarados do tão aguardado fim do expediente. Então você levou o copo de uísque à boca e, depois de um último gole, depositou o copo sobre a mesa e...
Eu corria, porque a melhor coisa a fazer era encontrar algum lugar para colocar em prática o plano C ou D ou beta – eu já não sabia quantos tinham sido todos aqueles anteriores que deram errado. A única certeza era essa: eu corria rumo ao tudo ou nada. Minha respiração entrecortada fazia um barulho inconstante, contrastando com a velocidade compassada dos meus pés enquanto eu subia as escadas com pressa. E eu sabia, mesmo que não quisesse acreditar, que tudo dependia de que eu chegasse ao terraço antes que eles o fizessem. Ainda faltavam seis ou sete lances de escada, mas...
Lá estava ela. Sorria um sorriso brilhante e sereno, mesmo tendo a mesma certeza que eu tinha: a da morte. Da cama da enfermaria, ela me observava com seus olhos sempre taxativos, como se soubesse de coisas que eu não fazia ideia que pudessem existir. E eu quase era capaz de ver a vida se esvaindo de seu corpo lentamente, feito uma luz fraca que brilha alguns milésimos de segundo e depois se dissipa sem nenhum motivo. Dias? Horas? Minutos? Nem os médicos eram capazes de dizer. E eu tentava não pensar a respeito disso, apesar de...
Você me mandou calar a boca por um instante. O jeito que você disse isso, fechando os olhos com aspereza e esfregando a testa com as mãos, me fez parar imediatamente de falar. Então eu olhei para o seu rosto e, mesmo parecendo meio bêbado – eu conhecia bem a sua falta de tolerância a álcool na corrente sanguínea –, seus olhos continuavam sóbrios. Nos beijamos ali mesmo. E o barman continuava a nos encarar com impaciência por cima de seus copos, pois agora éramos os únicos a impedir que o pub fechasse as portas. Você murmurou alguma coisa inteligível antes de segurar minha mão e ajudar-me a colocar o casaco, depois saímos para a madrugada abaixo de zero e entramos no seu carro. Dirigir na neve não era o seu forte, mas eu tinha talento para gostar dos seus defeitos.
Do telhado de um prédio de dez andares, eu aguardava com uma arma apontada para os outros telhados da vizinhança. Lá embaixo estava ele, o homem que eu precisava proteger, fazendo seu discurso de posse. A multidão ensandecida o idolatrava, balançando bandeiras, gritando e aplaudindo a cada vez que ele fazia uma breve pausa em sua fala. Então, no prédio logo à minha frente, eu os vi. Eram seis deles, vestidos de preto para não serem facilmente notados na escuridão. Antes que a adrenalina fosse embora, atirei. E minha mira se mostrou eficiente na tarefa: pelo menos um estava morto. Abaixei a cabeça, escondendo-me sob o peitoril enquanto os cinco restantes atiravam às cegas contra os prédios da vizinhança. Arriscando-me novamente, outro tiro. Mas a bala somente serviu para denunciar minha posição ao inimigo. A munição estava no fim, e seria tarde demais se eu não agisse com rapidez e destreza. Audaciosamente, fiquei de pé e mirei: tiro certeiro. Em seguida, movendo o braço um pouco para a esquerda, acertei um terceiro na altura do ombro. Os demais caíram depois de algumas tentativas, e somente um restava. Puxei o gatilho para finalmente poder dizer que completara aquela missão, e um clique na arma denunciou que a munição acabara. Sem tempo para qualquer reação, olhei para baixo instintivamente e assisti à queda fatal do homem, da minha missão, e do meu emprego. Um corpo jazia diante da multidão.
Acreditar que milagres existem não seria suficiente para impedir que a vida seguisse seu fluxo natural rumo à morte, feito um rio correndo para o mar. Ela estava indo embora, e eu já não era capaz de protegê-la ou proibi-la de me deixar. Talvez, caso eu ainda confiasse nessas bobagens depois que a solidão tomasse conta da minha existência, eu poderia me apegar à crença de que nos encontraríamos outra vez em algum além. Entretanto, no momento em que os seus olhos perderam o foco e o aperto firme de sua mão na minha foi se afrouxando lentamente, eu percebi que já não acreditava em mais nada.


Nota aos leitores: Parte do desenrolar deste conto foi baseada no filme Inception ("A Origem", assista ao trailer acima); com um quê de outro dos meus filmes favoritos, Cloud Atlas ("A Viagem", assista ao trailer clicando aqui). Isso também explica o título, que à primeira vista parece não fazer sentido. Recomendo imensamente estas duas obras de arte do cinema, caso você tenha gostado deste texto.

Sei

Tenho essa fascinação pelos seus olhos. Eu gosto da linha simétrica entre eles quando você faz de conta que está me lendo, como se eu fosse um livro de contos que você ganhou na infância. E mesmo sabendo o fim, você insiste nos meios, porque tem essa mania de ver as coisas diferentes a cada vez que olha. Você nem sabe – e eu não deveria estar contando –, mas sempre me parece tão imenso quando faz essa cara distraída. Causa em mim certo ciúme, porque me parece que você está pensando em todas as coisas ao mesmo tempo, e não só nas palavras que em mim encontra. Acho que seu começo tem um jeito de metade, e por isso me atrai. Também porque você sorri esse sorriso que, num silêncio brilhante, diz tudo o que eu preciso ouvir. No fim, apenas o meu anseio por pedir que você permaneça assim; sentado meio torto no sofá, com essa expressão sonhadora e pensativa, como se pudesse estender os domínios da sua mente até a minha. E eu sei que seu meio sorriso vai ser um sorriso inteiro quando perceber que eu te sei. E por te saber, descobri o quão fácil é te amar.