Você seria capaz de matar alguém? Assim, enfiando a faca
e pronto? Assim, lavando as mãos sujas de vermelho e pronto? Assim, escondendo
as provas e pronto?
Era nisso o que pensava Jeremias, enquanto encarava o
corpo inerte encostado à mesa. Ele fora capaz de matar, sim. E matou-a por
amá-la demais! Quando viu, estava morta. Quão efêmera é a vida? Quão fácil é
terminá-la? Mas quem mais teria esse direito se não ele? “Era a mim que ela
pertencia”, pensava Jeremias. E só ele mesmo tinha o direito de tirar o que é
seu.
Há poucos minutos estavam discutindo e ela confessou
tê-lo traído; não uma, mas várias vezes. Não com uma só pessoa, mas com várias
delas. O sangue lhe subiu à cabeça, a visão ficou turva, os movimentos
impensados. Ele a estrangulou com as próprias mãos, enquanto ela falava daquele
jeito meio fanho, pedindo perdão e implorando pela própria vida com lágrimas
nos olhos amedrontados. Não era a primeira vez que Jeremias espancava a esposa,
e ela já se tornara muito boa em se livrar das garras dele. Mas dessa vez foi
diferente, ele tinha necessidade de acabar com ela.
Mesmo assim, Cecília conseguiu se esgueirar das mãos
carrascas de Jeremias. Ela correu para a cozinha e agarrou uma faca, ameaçando
o marido. Disse que se desse mais um passo, ela o mataria. Mas será que seria
capaz? Será que dizia a verdade? Não importa mais. O fato é que Jeremias foi. E
com um movimento só, arrancou-lhe a faca da mão – arranhando o próprio braço na
ponta afiada – e, com a faca suja do próprio sangue, matou a mulher que amava: esfaqueando-a.
E agora? O que faria agora? Estava ela morta, jogada
sobre o chão da cozinha. Ficaria assim, e pronto? É dessa maneira que as coisas
terminam? Jeremias se levantou e tirou Cecília da poça de sangue, arrastando-a
para fora do chalé que alugaram para a viagem. O corpo sendo arrastado para
fora deixava um caminho de sangue no piso branco e lustroso. Jeremias cavou por
quase uma hora, depois colocou-a dentro; com cuidado, mas sem capricho. Deu-lhe
um último beijo e enterrou. Ali mesmo, no quintal. E depois foi embora, sem
sentir mais nada.
Não é uma história de amor; nem uma história de morte. É só
que a efemeridade da vida é tão simples e tão complexa, que faz pensar. A vida
chega e desaparece assim, e pronto. E a rotina, essa assassina de sonhos, nos
proíbe sob pena de morte de procurar a felicidade. Não se permita ser morto
pelos obstáculos.
“Que você não perca a vida tentando ganhá-la.”
(Autor desconhecido)
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